Organização
Pedro Fernandes de Oliveira Neto
Cesar Kiraly
Capa
Emilio Sacanavino
Projeto gráfico,
editoração eletrônica e diagramação
Pedro Fernandes de Oliveira Neto
Páginas
200
Formato
edição eletrônica
Autores desta edição
Rosana Banharoli, Leonardo Chioda, Lara Amaral, Grabriel Resende Santos, Alexandra Vieira de Almeida, Jairo Macedo, Homero Gomes, Thiago Souza, Mariano Tavares, Mario Filipe Cavalcanti, Casé Lontra Marques, Ana Romano.
Autores convidados
Marília Rothier Cardoso, Ordilei Costa dos Santos e Ésio Macedo Ribeiro
Descrição
O POETA DE MÃOS VAZIAS
Formato
edição eletrônica
Autores desta edição
Rosana Banharoli, Leonardo Chioda, Lara Amaral, Grabriel Resende Santos, Alexandra Vieira de Almeida, Jairo Macedo, Homero Gomes, Thiago Souza, Mariano Tavares, Mario Filipe Cavalcanti, Casé Lontra Marques, Ana Romano.
Autores convidados
Marília Rothier Cardoso, Ordilei Costa dos Santos e Ésio Macedo Ribeiro
Descrição
O POETA DE MÃOS VAZIAS
Também não é poeta quem desafina com o real a fazê-lo figuração própria para o poema. O poeta há ter lucidez suficiente para ver que o que está à sua volta não pode ser visível pelo olho comum, que esse mundo é cada vez mais mundo de aparência, e o poeta que só aparenta não é digno da confiança alheia. Não é suficiente para ele dedicar-se ao trabalho de perscrutar detalhadamente os movimentos da existência. A cópia fiel é uma tentativa fracassada. O verso há que erguer novas possibilidades de existir, como um caudaloso e perene rio universal a invadir e deslizar por entre o magma sufocador que irriga o mundo contemporâneo.
A busca incessante do poeta deve ser a de se reaproximar do
estágio genesíaco da poesia, quando espírito e homem comungavam reciprocidades.
Mas há que cuidar para ainda que involuntariamente não voltar a torre de marfim
de onde já lhe custou descer. Novamente aporta aqui a necessidade de ser
limiar. Esse retorno a unidade perdida é talvez o gesto de maior valor da
poesia. É por ele que somos reeducados a ver num mundo em que estivemos
limitados pelas vendas das ideologias; é por ele que o poema resiste e é cada
vez mais matéria necessária a refiguração do ser, situado que estamos num mundo
cuja existência foi subvertida a ponto de ser transformada em coisas entre
coisas.
No caso de Lúcio Cardoso é possível admitir pela extensa
vivência com palavra o caráter do poeta contemporâneo, ainda que ele esteja em
igualdade com muitos nomes de seu tempo dito modernista. Encontramos o autor a
se debruçar entre a prosa – o lugar textual com o qual primeiro obtivemos
contato – para somente depois compreendê-lo como ser de poesia; esse depois
apenas se restringe à produção do poema, que veio depois da prosa, mas
ultrapassa todo lugar anterior não apenas quanto ao número de textos do gênero
(são aproximadamente 547 poemas), mas porque a melhor parte daquele primeiro
lugar é também invadida sem nenhuma licença poética por esta. Produto,
certamente, de sua tentativa formal e que o distingue entre os vários nomes da
cena contemporânea: Lúcio foi, com Clarice Lispector, um dos precursores no
Brasil do romance de fluxo de consciência.
No caso aqui – na poesia – não há espaço para o
experimentalismo gratuito a ponto de por em risco as potencialidades do gênero.
Lúcio, o poeta, buscou revestir o poema da natureza mais humilde da palavra sem
fazê-lo num dizer pobre ou num dizer
situado no mais alto alcance do homem erudito. A erudição do poeta é uso de
uma dicção capaz de reinventar sem que a reinvenção esteja exposta como um
destaque visto propositalmente ao olho nu ou visto ainda naquela fronteira onde
só os docilizados pela matéria da erudição fabricada estão suscetíveis de
alcançar. Porque poeta, de fato, é quem ultrapassa o comum e o usual com a
mesma força que do comum e do usual, não quem se propõe a uma farsa barata com
a linguagem. O poeta é que de mãos vazias arranca novas possibilidades de
dizer.
Pedro Fernandes de Oliveira Neto